Quarenta e oito anos após a inauguração da BR-319, ocorrida em 27 de março de 1976, pelo então presidente da República, general Ernesto Geisel, no contexto da integração da Amazônia, sob o mote “integrar para não entregar”, somos convidados a refletir sobre a saga desta rodovia para avaliar se há o que comemorar nesta data.
Construída ao longo de oito anos em meio à floresta amazônica, o projeto da pavimentação total dos seus 877km ocorreu dentro do Plano de Integração Nacional, com cunho geopolítico pois se buscava integrar fisicamente o território nacional; tal plano foi criado pelo governo militar por meio do Decreto-Lei nº 1.106, de 16 de julho de 1970, assinado pelo presidente Emílio Garrastazu Médici.
A realidade paradoxal da BR-319 se caracteriza pelos dois extremos pavimentados e em boas condições de trafegabilidade, quais sejam o trecho de Manaus–AM ao Km 200, aproximadamente, e de Porto Velho-RO a Humaitá–AM (cerca de 220km), torna esta rodovia, provavelmente, a única do país que possui essa condição sui generis: seu trecho do meio, com aproximadamente 405 km, hoje não pavimentado mas em condição eventual de trafegabilidade com tempo seco, fica intrafegável quando chove.
Estranhamente, o MPF-AM lutou para que o processo de licenciamento da repavimentação da rodovia não fosse fracionado, quando, na verdade, a realidade da BR-319 é a de uma rodovia fracionada em pelo menos três segmentos: Manaus ao Km 200; trecho do meio; Humaitá a Porto Velho.
A luta pela retomada do tráfego na BR-319 não ignora os impactos ambientais que isto poderá causar, mesmo sabendo que o impacto maior foi causado quando de sua construção na década de 1970. Pelo contrário: entende-se que a repavimentação desta rodovia irá possibilitar a eficiente ação do Estado por meio de seus órgãos fiscalizadores que, conjugados, poderão coibir ações criminosas contra o meio ambiente, que inclusive já se encontram instalados no meio da rodovia com a presença da Polícia Militar.
Sem a trafegabilidade na BR-319, tem-se dificultada a presença dos órgãos fiscalizadores, criando um cenário favorável para a realização de crimes como biopirataria, extração ilegal de minérios e madeira, desmatamento, caça ilegal de animais silvestres etc. A luta pela BR-319 implica também em exigir que o Estado possa aparelhar melhor os órgãos fiscalizadores para preservar o ecossistema no entorno da rodovia.
A comemoração dos 48 anos da BR-319 manifesta-se, portanto, no despertar da consciência cidadã que se intensifica e cresce a cada dia com novas adesões, o que mostra que a cada dia os cidadãos estão mais conscientes na exigência do direito de usufruir de uma rodovia em condições de trafegabilidade, hoje uma realidade no inverno pela primeira vez desde 1998, que lhes garanta não só a possibilidade de escolher entre os modais de transporte, mas que lhes garanta o direito à presença do Estado como promotor de bens e serviços essenciais à dignidade humana.